15.8.06

Desviando-se do Mal

Sou um estudante de ciências sociais. Não conheço muita coisa de informática - só o que aprendi lidando com os problemas (infindáveis) de minha pobre máquina, causados exatamente por minha ignorância. Como disse num outro post, sou um novato entusiasta do GNU/Linux e da filosofia ou da idéia base do Open Source. Friso que o entusiasmo está, ao menos por enquanto, relacionado com o que o Software Livre representa enquanto idéia, ideologia ou posicionamento político; porque todo esse interesse ainda não foi suficiente pra me transformar num usuário pleno de qualquer distribuição Linux. Não vou mentir: escrevo esse artigo numa máquina rodando Windows XP, e ilegal (não instalei o Service Pack 2 pra não ter que lidar com aquele programa novo que a Microsoft criou pra detectar cópias ilegais do Windows). Todos os programas proprietários e não-freeware que estão instalados em casa são cópias ilegais - não são piratas porque não comprei de camelôs, mas são instalados a partir de mídias de amigos ou conhecidos, o que ainda é ilegal.

Se há alguma justificativa para se usar software pirata ou instalado a partir de uma cópia ilegal, seria a dependência. Sim, a Micro$oft foi muito eficaz ao aplicar o paradigma do traficante: ofereça gratuitamente as primeiras doses/porções/cópias e forme um dependente - depois cobre o que quiser, seu cliente vai pagar (ele não tem escolha). Assim, temos uma legião de usuários que simplismente não sabem o que fazer diante de outro sistema operacional que seja gratúito ou mais barato (como distros GNU/Linux ou BSD), na verdade não sabem o que fazer quando têm que lidar realmente e conscientemente com um computador ou com um sistema operacionai de verdade. São (e me incluo aqui) analfabetos funcionais da informática - dependem de sistema que exige autônomia e permissão para fazer tudo no lugar do usuário. E, nesse caso, para muitos, a ignorânica é uma benção - é só seguir os passos: abrir > concordar > next > next > install. O que realmente aconteceu - que permissões foram dadas - não interessa, interessa que está funcionando. Um exemplo: se você é usuário Windows, com certeza tem instalado no computador o browser Intenet Explorer e o Windows Media Player. Esses dois programas estão encrustados e amalgamados com as entranhas do Windows, de maneira que qualquer modificação neles ou sua desinstalação danifica o próprio Sistama Operacional - foi a forma que a Micro$oft encontrou pra enfiar seus produos de navegação na web e reprodutores de mídia (de menor qualidade em relação aos concorrentes, a princípio; essa foi, então, a solução da M$ para vencer a concorrência: embarcar seus produtos no seu SO) garganta abaixo dos consumidores. O pior conseqüência do problema da integração forçada associada ao modelo de permissões que toma todo usuário como incapaz, é que ao navegar na internet, por exemplo, o Internet Explorer aciona o Windows Media Player para abrir os arquivos de mídia como fotos, vídeos ou músicas sem pedir autorização ao usuário ou informá-lo que vai executar o arquivo. Ou seja, mesmo tendo instalado um anti-vírus e um firewall, sua máquina continua vulnerável se os vândalos tiverem disfarçado o vírus, worm ou spyware num arquivo de mídia, como uma simples imagem - se o IE ou o WMP executar, já era...

Mas é possível minimizar esses problemas sem ter que migrar automaticamente para o Linux ou para um Mac. É só deixar de usar o IE, substituíndo seu uso por outro navegador, como o Mozilla Firefox (aliás outra boa pedida é substituir o Outlook Express pelo Mozilla Thunderbird), isso vai evitar a "simbiose malígna" (© Joyce Adriani detém todos os direitos dessa expressão idiomáitica - usado sob permissão, eu acho...) entre o Windows e seus filhotes IE e WMP. Na verdade, também não é má idéia trocar seu media player por algum open source ou pelo Winamp (eu uso, e acho um barato - sobretudo pela diversidade de skins e pela participação dos usuários).

O curioso é que essas soluções para problemas de seguraça e confiabilidade do Windows, que atormentam os usuários dependentes, passam pelo uso de softwares open source. Esse tipo de programa é notoriamente menos vulnerável porque seu código é aberto, suas falhas ficam expostas para todo mundo - não há um proprietário que quer esconder os defeitos de seu produto - , assim todos os usuários podem contribuir reportando bugs e disponibilizando soluções (o tempo entre a identificação de um problema e a disponibilização de uma solução é de no máximo dias, quando não uma questão de horas, enquando um usuário Windows tem que esperar a segunda terça-feira do mês, que é a data da disponibilização das atualizações críticas da Microsoft). Sim, até os céticos têm que reconhecer: dá certo e é mais eficiente.

Se dá certo, é eficiente e é livre, porque parar nos exemplos dados acima? Que tal trocar o suite Microsoft Office pelo OpenOffice (disponível também na versão customizada em português do Brasil - BROffice)? Faz tudo que o M$ Office faz, é mais seguro e é livre, seu único defeito, quem sabe, é não possuir um visual tão atrativo quanto a suite da Microsoft. Na verdade, acredito que pra quase todo software proprietário haja uma versão open source que execute as mesmas funções - pode ser diferente e um pouco alien a princípio, mas isso não é exatamente um problema. E a quetão é que quanto maior no número de usuários, quanto maior o escopo e abrangência das aplicações, maior o número de contribuições e melhorias nos programas. Pesquise e veja que soluções open source exietem para sua área, e o que você pode fazer para ajduar.

De fato, senhores, temos duas virtudes aqui. A primeira, técnica, diz respeito à melhoria do uso do computador e dos recursos disponíveis ao usuário. A segunda é ética. Mesmo o usuário Windows pode ser menos contraventor ao optar por usar softwares livres, e isso pode ser uma porta para se livrar dos grilhões da ignorância e do abuso. Como dizem os rabinos, "não é por não conseguir cumprir um mandamento que vai-se deixar de cumprir outro", da mesma forma nos diz Tiago: "Aquele, pois, que sabe o bem que deve fazer e não o faz, comete pecado" (Tiago 4: 17). Não é intenção do blog ou desse post acusar o usuário de software proprietário fora das normas do contrato de uso - que diz que até a instalação a partir de uma mesma cópia em mais de um computador, sem o pagamento do número adicional de licensas, é ilegal -, antes reconhecemos que o uso anormal é resultado de uma prática comercial abusiva e injusta por parte de muitas empresas de software, o que acaba não deixando opções para o usuário pobre. A questão que aqui colocamos é que há alternativas, e que sua implementação involve uma mudança de hábitos gradual, mas necessária e éticamente inadiável. Resistência nem sempre é ir contra a lei, muito menos cometer mais injustiças - é contrariar o padrão que gera opressão. Para isso, nesse caso, basta boa vontade.

Abraço.


Recomendo enfaticamente a leitura dos artigos de Ricardo Bánffy, que é consultor em TI, usuário e promotor do software livre. Os textos são bastante instrutivos, atuais e acessíveis.